O Beija-Flor e o Prisioneiro
No silêncio abafado de uma cela apertada, onde a luz mal atravessava as grades, João passava os dias a contar os tijolos das paredes. Cada fissura era uma história, cada sombra, um lembrete do tempo que ali se esvaía. O vento quase nunca soprava naquele canto esquecido da penitenciária, mas, certa manhã, um zumbido delicado cortou o ar pesado.
João levantou a cabeça, intrigado. Um beija-flor, pequeno e vibrante, agitava-se do lado de fora da janela gradeada. Suas asas batiam tão rápido que pareciam desfocar a realidade, como se fossem um portal para outro mundo. O homem ficou imóvel, fascinado pela criatura que parecia estar tão fora de lugar quanto ele.
Dia após dia, o beija-flor voltava. Sempre à mesma hora, sempre pousando na mesma barra de ferro. João começou a esperar por ele, ansioso como se aquele pequeno visitante trouxesse uma nova razão para viver. Era o único lembrete de liberdade que ele tinha.
— Ei, passarinho, por que você vem aqui? — João perguntou certa vez, com um sorriso tímido. O beija-flor apenas inclinou a cabeça e continuou a sugar o néctar de uma florzinha que crescia entre as rachaduras do muro.
Com o passar dos meses, João começou a mudar. Antes um homem amargurado e revoltado, ele passou a sentir uma calma inesperada. Observando o beija-flor, ele aprendeu a valorizar os pequenos milagres: o vento que entrava por um buraco na parede, a gota de água que caía ritmicamente de uma torneira quebrada.
Um dia, o beija-flor não apareceu. João esperou, ansioso, mas o pequeno pássaro não veio. A ausência dele fez o prisioneiro sentir um vazio que ele não esperava. Algo dentro dele mudara; aquela criatura minúscula tinha trazido luz a um canto escuro de sua alma.
Naquela noite, João sonhou. Sonhou que era um beija-flor, voando por florestas verdes e vastas, sentindo o vento sob suas asas. Quando acordou, algo dentro dele estava diferente. Pela primeira vez, ele sentiu que a liberdade não era apenas uma questão de muros ou grades, mas de como se olhava para o mundo.
Algumas semanas depois, João foi solto por bom comportamento. Caminhando para fora da prisão, com o sol brilhando forte em seu rosto, ele parou. Ali, perto do portão de saída, estava o beija-flor. Ele o encarou por um momento, como se o pequeno pássaro estivesse ali para se despedir.
— Obrigado, amigo. — João murmurou, enquanto o beija-flor voava para longe, desaparecendo no céu azul.
João seguiu seu caminho, com a certeza de que, mesmo fora das grades, o verdadeiro voo era o da alma.
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 03/01/2025