O Professor que Não Sabia Ler
Na pequena cidade de Santo Sabido, onde as notícias voavam mais rápido que o vento e as fofocas eram mais comuns que a chuva, havia um professor chamado Cláudio. Ele não era um professor comum. Na verdade, ele era tão peculiar que sua história ficou famosa por toda a região, sendo contada de geração em geração. O que muitos não sabiam, e poucos ousavam perguntar, era que Cláudio... não sabia ler.
Aos trinta e sete anos, Cláudio havia sido designado para lecionar para a turma do quarto ano da escola municipal. Ele tinha tudo o que parecia necessário para ser um ótimo educador: uma voz forte e marcante, um entusiasmo que ninguém mais possuía e um bigode que, com certeza, o fazia parecer mais sábio do que realmente era. No entanto, havia um pequeno detalhe que ele tentava esconder a todo custo: ele nunca aprendeu a ler direito.
Claro, ele sabia o básico. Sabia reconhecer seu nome, sabia escrever “Cláudio” com todas as letras, e até sabia que a palavra "biblioteca" era um lugar onde livros eram guardados. Mas quando se tratava de livros, textos complexos ou mesmo aquelas cartilhas didáticas que ele deveria utilizar, sua habilidade de leitura começava a falhar dramaticamente.
No início, os alunos adoravam o professor Cláudio. Ele contava histórias fantásticas sobre suas aventuras (que, na verdade, eram apenas invenções de sua própria cabeça). Ele tinha um talento único para fazer qualquer coisa parecer uma lição de vida, mesmo quando não fazia o menor sentido. Seus alunos, ansiosos por aprender, ficavam encantados com seus relatos mirabolantes.
Um dia, a diretora da escola, Dona Efigênia, decidiu que era hora de Cláudio aplicar um teste de leitura. Ela sabia que ele tinha potencial, mas precisava ver o progresso da turma. E lá estava o professor, pronto para o grande momento. “Hoje, crianças,” ele anunciou, “vamos fazer um exercício de leitura.” Ele puxou um livro grosso da prateleira e olhou para as páginas com um sorriso nervoso. Ele nunca tinha lido aquele livro. Na verdade, ele nem sabia qual era o nome dele.
Os alunos começaram a ler em voz alta, cada um tentando decifrar as palavras com entusiasmo, enquanto Cláudio, com seu bigode empoleirado, apenas observava, seu olhar se fixando em cada linha, tentando identificar algum padrão que o ajudasse. Mas quanto mais ele olhava, mais se perdia. As palavras dançavam diante dos seus olhos como se estivessem em uma festa secreta, escondendo seus significados.
“Agora, Cláudio,” disse Dona Efigênia, aproximando-se dele com uma expressão que combinava preocupação com curiosidade, “poderia nos dar sua leitura da página 42?”
Cláudio olhou para a página, respirou fundo e, com um sorriso travesso, começou a “ler” com uma confiança absurda.
“Era uma vez... uma... um... cavalo... de fogo... que voava... muito alto. E... e ele tinha... uma missão muito importante...” Ele pausou, olhando para as crianças, que estavam boquiabertas. “Eu acho que era salvar o mundo. E no final... ele... ele ganhou... um prêmio!”
Os alunos olhavam uns para os outros, sem saber se deveriam rir ou aplaudir. Dona Efigênia, com um sorriso forçado, olhou para a página 42, que dizia algo completamente diferente sobre a Revolução Francesa. Mas ela não ousou interromper. O que poderia fazer? O professor tinha a confiança de um líder espiritual, mesmo que sua leitura fosse mais fantasia do que história.
E assim, semana após semana, as aulas de Cláudio continuavam com suas leituras imprevistas e suas lições inventadas. Ele nunca mais foi desafiado a ler em voz alta, mas as crianças aprenderam a se adaptar. Cada história que ele contava se transformava em algo único e engraçado. Alguns até achavam que a matéria de História nunca foi tão divertida, porque sempre envolvia dragões, piratas e um ou outro gigante com óculos de sol.
Certo dia, Cláudio se viu em uma situação inesperada. O prefeito da cidade, preocupado com os resultados de exames acadêmicos, fez uma visita à escola. Ele pediu para assistir a uma aula. Cláudio estava em pânico. Como ele explicaria a situação? Mas, com sua típica coragem, ele tomou uma decisão: se ele fosse cair, cairia de cabeça erguida.
Durante a aula, ele estava tão nervoso que decidiu improvisar ainda mais. Em vez de ler um livro, ele pegou uma folha em branco e começou a escrever o que ele chamava de “poesia da educação”. Ele leu com fervor:
“Na estrada do saber, encontramos o caminho,
Com livros de capa dura e páginas finas.
Quem não souber ler, que olhe para o céu,
E veja que o mundo é muito maior que um papel!”
O prefeito olhou para ele, estupefato. Depois, se virou para Dona Efigênia, que já não sabia se ria ou chorava. Mas, surpreendentemente, o prefeito levantou-se e aplaudiu. “É isso mesmo, professor Cláudio! Sua habilidade de criar histórias e encantar os alunos é realmente admirável! Continue assim!”
A partir daquele dia, Cláudio tornou-se uma lenda local. Ele não era o melhor professor de matemática, nem o mais capacitado em português, mas era, sem dúvida, o mais amado e o mais criativo. Afinal, quem precisava ler se se podia inventar um mundo inteiro em uma sala de aula?
E assim, a história do professor que não sabia ler se espalhou por Santo Sabido, e, de alguma forma, todos aprenderam uma grande lição: para ensinar, não é preciso sempre seguir o livro. Às vezes, um pouco de imaginação e um bom bigode resolvem tudo.
Fim.
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 04/01/2025