Confissões ao vento
O mais bonito retrato é o da própria natureza, pois, Deus com humildade fez sem tintas a sua beleza.
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A Tartaruga que Salvou uma Floresta
Na beira de uma floresta densa e impenetrável, onde a luz do sol mal conseguia tocar o chão, havia um pequeno vilarejo. O povo que ali vivia nunca se aventurava além das árvores, e as histórias sobre a floresta eram sempre contadas com medo e mistério. Diziam que ali moravam seres antigos, guardiões da natureza, e que quem se perdesse entre suas trilhas nunca mais seria visto. Mas o mais intrigante de todas as histórias era a lenda da tartaruga.

Ela não era uma tartaruga qualquer. Alguns acreditavam que ela era imortal, outros diziam que possuía um poder que nenhum ser humano poderia entender. Seu nome era Tami, e sua carapaça tinha o tom dourado do pôr do sol, refletindo a luz de uma maneira que parecia quase sobrenatural.

A história começou numa manhã nebulosa, quando um grupo de madeireiros chegou ao vilarejo. Eles estavam decididos a cortar uma grande parte da floresta para vender a madeira e expandir as terras. As árvores antigas, com raízes profundas e histórias milenares, seriam derrubadas sem piedade. Os moradores, temendo o pior, tentaram impedi-los, mas os madeireiros eram muitos e a ameaça parecia inescapável.

O líder da vila, um homem de idade avançada e rosto enrugado, convocou uma reunião urgente. Todos estavam desesperados, temendo que a destruição da floresta significasse o fim do vilarejo. E foi nesse momento que alguém mencionou a lenda da tartaruga dourada. Alguns riram, outros olharam com desconfiança, mas todos sabiam que, se houvesse alguma chance de salvação, ela viria de Tami, a tartaruga que ninguém havia visto há muitos anos.

Em uma manhã silenciosa, quando o vento parecia sussurrar segredos, uma jovem chamada Lúcia decidiu buscar a tartaruga. Guiada pelas histórias que sua avó lhe contava, ela se afastou do vilarejo e entrou na floresta, movendo-se com cautela. A mata estava densa, mas Lúcia conhecia bem as trilhas, os sons e o cheiro da terra. Ao longo do caminho, o ar parecia mais denso, e a sensação de que algo a observava fazia com que sua pele se arrepiava.

Após horas caminhando, Lúcia chegou a um pequeno lago escondido entre as árvores. A água estava calma, refletindo a luz suave que atravessava as copas das árvores. Ali, à beira da água, estava Tami. Sua carapaça dourada brilhou, e ela olhou para Lúcia com olhos que pareciam saber mais sobre o mundo do que qualquer ser humano jamais soubera.

Lúcia se aproximou com respeito e, sem saber o que dizer, apenas se ajoelhou diante da tartaruga. “Por favor, Tami,” ela sussurrou. “A floresta está em perigo. Os madeireiros estão chegando, e não sabemos o que fazer. Precisamos da sua ajuda.”

A tartaruga permaneceu imóvel, como se estivesse avaliando a situação. Lúcia, com o coração batendo forte, não sabia se a tartaruga entenderia suas palavras, mas havia algo em seus olhos que a fazia sentir que ela poderia. Finalmente, depois do que pareceu uma eternidade, Tami levantou lentamente a cabeça, movendo-se em direção ao centro do lago.

Com uma calma imponente, Tami mergulhou nas águas claras, e uma estranha sensação de paz tomou conta de Lúcia. Ela não sabia explicar o que acontecia, mas sabia que algo estava prestes a acontecer.

Na manhã seguinte, os madeireiros chegaram à floresta, confiantes de que poderiam começar a derrubar as árvores. Mas algo os impediu. Uma enorme onda de energia parecia emanar da floresta, fazendo com que as árvores se erguessem como se estivessem vivas, suas raízes se entrelaçando e se expandindo em direções inesperadas. A terra tremeu sob os pés dos madeireiros, e uma bruma espessa se levantou, obscurecendo a visão.

Quando os homens tentaram cortar as árvores, descobriram que suas ferramentas estavam inutilizáveis, como se a floresta tivesse criado uma barreira invisível contra a destruição. As lâminas dos machados não cortavam, e as serras, por mais que tentassem, não conseguiam atravessar as copas das árvores. Algo muito mais forte do que eles jamais haviam enfrentado estava os desafiando.

Desesperados, os madeireiros tentaram fugir, mas uma força invisível os empurrou para fora da floresta. As árvores se fecharam atrás deles, como se nunca tivessem sido tocadas. E, no centro da clareira, Tami apareceu novamente, movendo-se com a lentidão característica de sua espécie, mas com uma majestade incomparável.

Lúcia, que assistia tudo de longe, sentiu uma onda de alívio e gratidão. A tartaruga dourada, com seu poder ancestral, havia salvado a floresta. Ela não precisou de palavras, não precisou de promessas. Apenas seu ser calmo e enigmático fez o que parecia impossível.

Quando Lúcia retornou ao vilarejo e contou a história, ninguém duvidou de suas palavras. A lenda da tartaruga se tornaria mais forte do que nunca, e as gerações futuras ouviriam falar de Tami como a guardiã eterna da floresta.

A floresta foi preservada, e os madeireiros nunca mais voltaram. Mas os moradores de Santo Verde sabiam que a proteção não vinha de espadas ou armas. Ela vinha de algo muito mais antigo e misterioso, algo que só a natureza e suas criaturas mais antigas podiam oferecer.

E assim, a tartaruga dourada, que ninguém mais via, seguiu seu caminho silencioso, mas sempre presente, entre as sombras e as árvores. Ela não precisava de reconhecimento. Sua missão estava cumprida, e a floresta continuaria a respirar livremente, sob sua proteção eterna.

Fim.
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 04/01/2025
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