Confissões ao vento
O mais bonito retrato é o da própria natureza, pois, Deus com humildade fez sem tintas a sua beleza.
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O Outro Sou Eu
Era uma noite qualquer, mas para ela, parecia que o universo conspirava. O vestido branco pendurado no cabide carregava o peso de um futuro que não era o seu. Na mesa, as alianças repousavam sob o brilho amarelado da luz, mas sua mente estava longe. O coração batia por outro, aquele que nunca usaria um terno naquele altar, aquele que não era seu noivo, mas sempre fora seu.
Ele chegou tarde, como sempre fazia. Não pela hora, mas porque sempre vinha depois dos compromissos dela, das regras impostas por outros, das promessas feitas com palavras que jamais carregaram verdade. Tinha aquele olhar de quem sabia mais do que dizia, mas preferia o silêncio. E era ali, na ausência de palavras, que ela encontrava tudo o que precisava ouvir.
— Você está linda. — A voz dele cortou o espaço com a suavidade de quem carrega uma verdade incontestável. Não era a primeira vez que a via vestida de branco, mas naquele momento, parecia diferente. Talvez porque ela estivesse tão próxima de pertencer a outro homem. Talvez porque ele soubesse que nunca seria o escolhido.
— E você está atrasado. — Ela respondeu, tentando soar leve, mas a voz vacilou.
Sentaram-se no chão, como sempre faziam, porque formalidades nunca foram o forte deles. Ele pegou uma das alianças e começou a girá-la entre os dedos, com a naturalidade de quem queria distrair o próprio coração.
— Engraçado como um pequeno anel pode parecer tão grande quando não pertence ao coração certo.
Ela desviou o olhar. Não queria chorar, não ali, não com ele. Mas as lágrimas vieram, teimosas, inundando a verdade que ela tentava esconder.
— Por que você não disse nada antes? — Sua voz saiu quase num sussurro.
— Porque o amor verdadeiro não precisa ser dito para existir. Eu sempre soube onde estava o seu coração, mesmo quando você não sabia.
Era difícil respirar. A sala parecia menor, mais apertada. O mundo todo parecia girar em torno deles. E naquele instante, ela entendeu. Ele era o outro, mas também era o único.
— E agora? — perguntou, a voz trêmula.
— Agora, você decide. — A calma em sua voz era de quem já havia feito sua escolha muito tempo atrás. — Mas lembre-se, não é a aliança que define o amor. É quem segura sua mão quando o mundo inteiro desaba.
Ela o olhou. Não havia cerimônia ou vestido que pudesse esconder o óbvio. O amor não seguia regras, nem datas marcadas no calendário. Ele apenas era.
Na manhã seguinte, o cabide estava vazio. O vestido branco, intocado. E ela, finalmente livre, corria em direção ao amor que sempre fora dela, para os braços daquele que nunca precisou de um anel para ser seu.
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 04/01/2025
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