O Padre, o Delegado e a Noiva Fugitiva
Na pequena cidade de São Jacinto, onde até o canto do galo era pauta para fofocas, o casamento do ano estava marcado. O delegado Severino, um homem robusto, com bigode de respeito e fama de durão, finalmente havia conquistado o coração da jovem e bela Maristela, filha da quitandeira Dona Zefa. Todos aguardavam ansiosos pela cerimônia, que seria celebrada pelo carismático Padre Honório, conhecido por seu sermão cheio de metáforas criativas.
No grande dia, a igreja estava abarrotada. As senhoras do coro tinham ensaiado uma semana inteira e a comunidade se esmerou na decoração. O delegado chegou pontualmente, com seu uniforme impecável, exibindo o revólver no coldre como quem dizia: “Sou autoridade até no altar.”
Mas a noiva, ah, a noiva... Essa parecia nervosa demais. Seus olhos estavam inquietos, e ela olhava para o relógio de parede da igreja com uma frequência que chamava atenção. Padre Honório, percebendo o desconforto, sussurrou para ela:
— Está tudo bem, filha?
— Padre, é agora ou nunca — respondeu ela, quase inaudível.
Antes que o padre pudesse entender o que significava aquele "agora ou nunca", Maristela deu um sorriso cúmplice. Padre Honório, que era mais esperto do que aparentava, pegou sua batina e deu um jeito de sussurrar de volta:
— Está pensando o mesmo que eu?
— Se está pensando em fugir, estamos sincronizados! — respondeu ela, com um brilho no olhar.
De repente, enquanto o delegado ajeitava o bigode e os convidados comentavam sobre como Maristela estava deslumbrante, um burburinho começou no altar. Quando todos olharam, a noiva e o padre já não estavam mais lá. A confusão foi geral.
— Onde foi parar minha noiva? — gritou o delegado, indignado.
Uma das beatas tentou amenizar a situação:
— Calma, delegado, talvez ela só tenha ido retocar a maquiagem.
— E o padre? Foi levar o batom?
A resposta veio rápida: um menino que estava brincando na porta da igreja entrou correndo, ofegante, e gritou:
— Vi os dois subindo na lambreta do padre! Ele disse que ia pra outra paróquia e levou ela junto!
A lambreta de Padre Honório era famosa na cidade, uma verdadeira relíquia que sempre andava aos trancos e barrancos. Dizem que ela tinha um motor que funcionava melhor quando estava em fuga.
Severino, furioso, montou em sua viatura e iniciou uma perseguição digna de cinema. As ruas de paralelepípedo de São Jacinto testemunharam o delegado, a viatura, a lambreta e metade da população correndo atrás dos fugitivos. Mas, quando chegaram na entrada da estrada, só encontraram o véu de Maristela preso num galho e uma carta pendurada no espelho da igreja.
A carta dizia:
"Queridos amigos de São Jacinto,
Fomos tomados por um amor inesperado. Não podíamos viver em mentira. Maristela não queria um casamento por conveniência, e eu... bem, eu cansei de falar de amor e nunca vivê-lo. Estamos indo para longe, mas deixo minha benção.
Com carinho,
Padre Honório e Maristela."
A cidade ficou em choque, mas não demorou para as fofocas se tornarem piadas. O delegado, ainda furioso, acabou se apaixonando por uma das madrinhas do casamento e, dizem as más línguas, começou a frequentar outra igreja — só por precaução. Enquanto isso, Padre Honório e Maristela nunca mais foram vistos, mas rumores afirmam que eles abriram um restaurante numa praia distante, onde servem pratos com nomes peculiares como “Fugido ao Molho de Amor” e “Coração à Moda da Lambreta”.
E São Jacinto nunca mais teve um casamento tão memorável!
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 04/01/2025