Confissões ao vento
O mais bonito retrato é o da própria natureza, pois, Deus com humildade fez sem tintas a sua beleza.
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A Filha do Carpinteiro
A chuva caía fina sobre as telhas de cerâmica da pacata Vila das Palmeiras. Era uma dessas noites em que o silêncio só era quebrado pelo som da água escorrendo pelas calhas e pelo ocasional miado de um gato errante. Mas naquela noite, um grito rasgou o ar.

A filha do carpinteiro, Isabela, estava desaparecida.

Isabela tinha apenas 17 anos e era conhecida por sua gentileza. Trabalhando com o pai na oficina, ajudava a esculpir móveis delicados que encantavam a comunidade. Seu desaparecimento era um mistério que abalava o vilarejo.

O delegado Augusto, homem experiente e cético, assumiu o caso. Com um chapéu de feltro e botas gastas, ele caminhou até a casa de João, o carpinteiro. Encontrou-o sentado na varanda, o olhar perdido no vazio.

— Quando foi a última vez que viu sua filha? — perguntou Augusto.

— Ontem à noite — respondeu João, a voz trêmula. — Ela disse que ia à casa de uma amiga, mas não voltou.

Augusto começou a investigar. Na oficina, encontrou uma carta meio queimada na lareira. Os restos indicavam que Isabela estava se correspondendo com alguém, mas o destinatário era um mistério. O que restava da mensagem dizia: "Encontre-me no lugar de sempre às 22h...".

O delegado seguiu as pistas. Descobriu que Isabela costumava passear perto do velho moinho abandonado. Ao chegar lá, encontrou pegadas recentes na lama e, próximo ao rio, um lenço ensanguentado.

Enquanto isso, boatos circulavam na vila. Uns falavam de um forasteiro que havia chegado dias antes, um sujeito de cabelos desgrenhados que evitava contato com os moradores. Outros diziam que Isabela estava envolvida em algo perigoso, embora ninguém soubesse exatamente o quê.

Augusto interrogou várias pessoas, incluindo a melhor amiga de Isabela, Clara. Ela hesitou antes de confessar:

— Isabela estava... apaixonada por alguém que o pai dela não aprovava. Um homem mais velho, chamado Miguel.

Miguel era o forasteiro. Ele vivia numa cabana na mata, longe dos olhares curiosos. Quando Augusto chegou à cabana, encontrou Miguel empacotando suas coisas, como se planejasse uma fuga.

— Está indo a algum lugar, Miguel? — perguntou o delegado, com a mão na arma.

Miguel tentou negar, mas sua expressão o entregava. Após uma busca na cabana, Augusto encontrou uma caixa com joias e cartas. Uma das cartas era de Isabela, pedindo que Miguel fugisse com ela.

— Eu não fiz nada! — disse Miguel. — Isabela queria escapar daqui, mas eu nunca a machucaria.

Apesar da suspeita sobre Miguel, o delegado sentia que algo não encaixava. No dia seguinte, um pescador encontrou o corpo de Isabela preso em galhos no rio. A autópsia revelou que ela havia sido golpeada na cabeça antes de ser jogada na água.

Ao investigar mais a fundo, Augusto descobriu uma reviravolta: João, o carpinteiro, havia discutido violentamente com Isabela na noite de seu desaparecimento. Ele descobrira sobre Miguel e estava furioso com a ideia de sua filha fugir.

Pressionado, João confessou.

— Eu não queria machucá-la... Foi um acidente! — disse ele, chorando. — Nós brigamos, ela caiu, bateu a cabeça. Entre o desespero e o medo, cometi o pior erro da minha vida.

O caso foi encerrado. João foi levado preso, e Miguel, embora inocentado, decidiu deixar a vila. A oficina do carpinteiro fechou, e a Vila das Palmeiras nunca mais foi a mesma.

No fim, o delegado Augusto refletiu sobre como a verdade, por mais cruel que seja, sempre vem à tona. O silêncio da vila voltaria, mas o grito daquela noite ecoaria para sempre na memória de quem o ouviu.
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 13/01/2025
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