A Cidade que Vendeu o Papa
Dona Geralda era a beata mais fervorosa da pacata cidade de Santa Esperança. Rezava o terço três vezes ao dia, tinha uma capelinha particular na sala de casa e era a primeira a chegar e a última a sair da missa. Mas, além de religiosa, era também muito preocupada com a situação da cidade.
O prefeito Juvenal andava com o juízo estourado. O município estava quebrado, as ruas pareciam um queijo suíço de tanto buraco, a escola não tinha merenda e o único hospital era mais um centro de orações do que de curas. O pior de tudo: a festa da padroeira estava chegando, e nem um tostão para a decoração da praça.
Foi aí que Dona Geralda teve uma ideia iluminada — segundo ela, um chamado divino. Durante uma reunião emergencial na prefeitura, onde o prefeito e seus assessores tentavam inventar uma solução mirabolante, ela se levantou, bateu na mesa e anunciou:
— Vamos leiloar o Papa!
O silêncio na sala foi tão grande que deu para ouvir um pernilongo tossindo no corredor.
— Como é que é, Dona Geralda? — perguntou o prefeito, coçando a testa.
— Isso mesmo! Se o senhor não tem dinheiro, a gente faz um leilão beneficente. E o que tem mais valor para nós, católicos, do que Sua Santidade?
— Mas a senhora endoidou? O Papa não está à venda!
— Claro que não! Mas quem precisa saber disso? Só colocar no cartaz: “Grande Leilão de Santa Esperança! O maior prêmio: O Papa José!” Pronto! O povo cai matando!
O prefeito ainda tentou argumentar, mas a ideia já tinha se espalhado pela cidade. Em menos de duas horas, os alto-falantes da igreja anunciavam:
📢 “ATENÇÃO, POVO DE DEUS! AMANHÃ, GRANDE LEILÃO EM PROL DA RECONSTRUÇÃO DA NOSSA CIDADE! O PRÊMIO MAIS ESPERADO: O PAPA JOSÉ!”
A notícia correu tão rápido que até o bispo da diocese ligou querendo saber se era verdade.
No dia seguinte, a praça estava lotada. O povo veio de tudo quanto era canto, jornalistas apareceram, e até um senhor muito rico de São Paulo, crente que estava comprando um almoço com o Papa, trouxe um cheque em branco.
O leiloeiro, um sujeito acostumado a vender porcos e galinhas, subiu no palco meio desconfiado. Pegou o microfone e gritou:
— Começamos o lance em 10 mil reais! Quem dá mais pelo Papa?
O rico de São Paulo gritou:
— CEM MIL!
O prefeito começou a suar frio. E Dona Geralda, ajoelhada ao lado do palco, rezava agradecendo a Deus pela obra que estava prestes a fazer.
— UM MILHÃO! — gritou um empresário espanhol, já sonhando em ter o Papa como convidado especial de um casamento na família.
Foi nesse momento que o caos começou. O bispo apareceu berrando que aquilo era sacrilégio, o prefeito tentou fugir pela lateral do palco, e Dona Geralda, sem entender a confusão, apenas suspirou e disse:
— Vocês não têm fé nenhuma…
No fim das contas, ninguém levou o Papa para casa, mas o tal empresário espanhol, de tanta pena da cidade, fez uma doação generosa para tapar os buracos das ruas. O prefeito jurou que nunca mais deixaria Dona Geralda participar de reuniões na prefeitura, mas a beata seguiu rezando, convicta de que sua ideia foi um milagre.
E assim, Santa Esperança nunca esqueceu o dia em que quase vendeu o Papa.
Lucileide Flausino Barbosa
Enviado por Lucileide Flausino Barbosa em 08/02/2025